domingo, 8 de março de 2009

O DIA EM QUE TENTARAM MATAR BOB MARLEY 3ª Parte

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Levaram Bob à praia de Helshire e disseram-lhe que queriam 2.000 dólares por dia, a serem apanhados diariamente em duas vezes, até que o dinheiro estivesse pago com juros. Bob, que nada sabia de subornos, mostrou-se hesitante em concordar com tal proposta. Os pistoleiros estavam nervosos, e alguns deles sacaram as armas.

Bob olhava bem os homens que lhe apontavam revólveres e cujas mãos começavam a tremer. Fitou-os durante longo tempo, o bastante para que eles soubessem que estavam sendo marcados. Um peso-pesado de Concrete Jungle, de nome Donkey Collar, interveio e tentou esfriar as coisas. Os revólveres voltaram aos coldres e cinturas, mas os homens que os haviam sacado estavam como que tontos, suando, perturbados. O grupo dispersou-se. As coletas de dinheiro tiveram início pouco depois: o mensageiro dos pistoleiros aparecia duas vezes por dia, regularmente. E essas idas e vindas tão regulares não passavam despercebidas na atmosfera modorrenta de Kingston.

Em outubro, um contingente de pistoleiros do PNP apareceu na Casa da Ilha, e Bob conduziu-os até seu pequeno escritório no andar superior. Fechando a porta atrás de si, os homens iniciaram a conversa fazendo-lhe perguntas inconseqüentes acerca de sua carreira. Finalmente chegaram ao assunto principal: estaria Bob disposto a dar um concerto ao ar livre, a ser chamado “Sorri, Jamaica”, no dia 5 de dezembro? Não se tratava de política, disseram eles; só música para “manter as coisas sob controle até a eleição de 16 de dezembro”.

“Está bem, cara, disse Bob em voz calma. Eu dou o concerto”.

Irmãos dread foram até Bob pedir-lhe que esperasse até depois das eleições e Bob recusou.

O mensageiro de Concret Jungle continuava a chegar duas vezes por dia para apanhar o dinheiro; os recibos, assinados por Bob, começaram a aparecer em mãos de bandidos seletos da Jungle, que os tratavam como “excelentes souvenires”. Bob sabia que estava numa situação difícil, da qual não conseguiria escapar.

Nas primeiras horas da manhã de 25 de novembro, Bob acordou molhado de suor. Tinha sonhado com um tiroteio; no pesadelo, não conseguia ver imagens – somente os sons, o clarão e o cheiro de cartuchos disparados em sua direção.

A partir da segunda-feira da semana anterior ao festival “Sorri, Jamaica”, programado para o domingo seguinte, um esquadrão armado de vigilantes do PNP, que se dizia chamar esquadrão Eco, passou a montar guarda, vinte e quatro horas por dia, na Hope Road. Brandindo seus rifles automáticos, não permitiam que virtualmente ninguém, a não ser os membros da banda, entrasse ou permanecesse nos arredores da casa sem licença prévia.

Na segunda-feira de manhã o mensageiro chegou, dizendo-se “irmão” de Bob, mas foi mandado de volta; o mesmo aconteceu à tarde. A coisa repetiu-se na terça, na quarta e na quinta. Na sexta-feira o mensageiro não apareceu.

Às 8h45min da noite de sexta-feira, Seeco Patterson, percussionista dos Wailers, olhou por acaso através das persianas da varanda fronteira da Casa da Ilha e notou, à luz do pôr-do-sol, que os membros do Esquadrão Eco já não se encontravam no portão nem no terreno.

Bob estava na cozinha, na parte traseira da casa, deglutindo um bago de “grapefruit” quando um estalido surdo o fez deixar cair o bago no chão. Foi nesse instante que Don Taylor, que vinha entrando e caminhava, falando, na direção de Bob, sentiu que as balas lhe perfuraram a parte posterior das pernas.

Taylor foi arremessado para a frente pelo impacto das balas. Caiu, mas não perdeu os sentidos, e pode ouvir à sua volta um cerrado tiroteio, aparentemente de armas automáticas. Só então desmaiou.

Eram 9h12min da noite quando um dos atacantes, empunhando um rifle, pulou da cozinha para a copa, contra a qual havia nervosamente e, depois temerariamente disparado.

Don Taylor continuava atirado ao chão da cozinha, com hemorragias internas e externas provocadas pelas quatro balas alojadas na parte superior das duas coxas, além de outra na base da coluna. Não sabia que, devido à sua proximidade casual naquele instante, ele havia escudado com o próprio corpo o corpo de seu chefe e assim salvo a vida de Bob Marley.

Alguns momentos antes, os seis ou sete membros dos Wailers estavam reunidos, juntamente com os Zap Pow Horns, na varanda lateral da casa, ensaiando. Tinham acabado de fazer uma breve pausa quando Taylor, após a reunião para tratar de negócios no Kingston Sheraton, chegou à Casa da Ilha e se pôs a procurar por Bob.

Sem que Taylor o soubesse, dois Datsuns brancos com pelo menos sete pistoleiros de Concrete Jungle tinham seguido seu carro.

Enquanto ele estava na casa, eles passaram pelos portões enferrujados da entrada, um carro bloqueando a saída em quanto o outro seguia rapidamente para o casarão. Num instante, os dois carros estavam vazios e os pistoleiros crivavam a fachada da casa com rajadas de rifles e pistolas automáticas, quebrando as vidraças e estilhaçando os portais e a alvenaria do andar térreo. Quatro pistoleiros cercaram a casa, enquanto dois outros montavam guarda no pátio fronteiro.

Rita foi baleada por um desses dois homens do pátio no instante em que corria para fora da casa com os cinco filhos de Marley e um repórter do Daily News da Jamaica; a bala atingiu-a na cabeça, fazendo-a erguer-se no ar, alojando-se entre o couro cabeludo e o crânio.

Foi então que o segundo pistoleiro, um rapazinho de não mais de 16 anos, arrombou uma porta que dava para a Hope Road. A namorada do organista Tyrone Downie estava logo atrás do rapaz – que nem percebeu sua presença – e viu quando ele apontou a pistola para o local do ensaio e pôs-se a disparar, de olhos fechados, as balas atingindo o órgão e o teto.

Enquanto isso, um homem com um rifle automático tinha atravessado a porta traseira da copa, empurrando para longe Seeco Parterson, que procurava fugir, para apontar a arma contra Bob Marley, que se encontrava atrás de Don Taylor. Bob nem chegou a fazer uma tentativa de esquivar-se de seu agressor. Ao ver o cano da arma automática entrar na cozinha, julgou que fosse alguém do Esquadrão Eco ou da polícia, fazendo alguma vistoria. Só então percebeu que o rifle estava erguido em sua direção.

O pistoleiro disparou oito tiros. Um deles atingiu um armário, um outro alojou-se no teto, e cinco atingiram Don Taylor. A última bala atravessou o peito de Marley, abaixo do coração e saiu-lhe pelo braço.

O guitarrista americano Donald Kinsey, o membro mais recente dos Wailers, estava de pé no corredor, quando o homem armado de rifle saiu correndo através da copa, deixando Taylor e Marley para trás. Kinsey pulou para a sala ao lado e agachou-se atrás de uma caixa de equipamento. Não tinha a menor noção do que estava acontecendo; era sua primeira viagem a Kingston.

Milagrosamente ninguém morreu nesse ataque noturno. Um carro da polícia passou pó acaso pelo local quando o pandemônio atingia o auge e fez com que os quase-assassinos se assustassem e fugissem em alta velocidade. Se os assaltantes daquela noite tinham tentado assassinar Marley, sua família e amigos tinham fracassado. Mas Don Taylor estava gravemente ferido; Lewis Griffith, amigo de Bob, necessitava de urgentes cuidados médicos; Rita sangrava abundantemente. Bob cambaleou, tonto, de um lado para outro, sua roupa cáqui ostentando enormes manchas de sangue no peito e nas coxas. A atmosfera que se seguiu foi de espanto, derrota e terror paralisante. (continua)

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